segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Suspect - Capítulo 9: Uma pequena ajuda

9. Nem tudo nessa vida é fácil
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Scott: Minha vítima.
Ele manteve o mesmo tom sério. Com certeza uma pessoa diferente da noite anterior.
Confesso que eu não soube como reagir. Quer dizer, de todos os assassinos no mundo, por que logo ele?
Charlotte: Desculpe, mas não sei do que você está falando. Adam veio me procurar para matar seu amigo que está ameaçando a segurança dele e de sua família.
Scott: Oliver teve sua neta sequestrada por Adam.
Pensei por um momento. 
Charlotte:  Quem é Oliver?
Scott: Meu cliente.
Empurrei a foto que havia ganhado de Adam para Scott, e então apontei para o outro homem.
Charlotte: É esse aqui?
Ele ficou pensativo por alguns longos segundos, e então confirmou.
Charlotte: Como você tem certeza de que Adam sequestrou a neta de Oliver?
Scott: É simples. Os dois estão brigando há anos, e agora, a neta de um deles desaparece. Quem você culparia?
Charlotte: Isso não significa nada. Eu quero provas.
Scott: Eu já investiguei essa história inteira. Mas vá em frente. Faça do seu jeito.
Peguei a foto e a coloquei no bolso. Em seguida, levantei.
Charlotte: É o que farei.
Fui em direção ao beco. Mesmo que ainda fosse cedo para o local estar cheio, eu sabia que a pessoa que eu precisava estaria lá.
No caminho, pensei sobre o assunto. Obviamente, um dos dois estava mentindo. As histórias eram extremamente semelhantes. O problema não seria apenas descobrir quem, mas sim se valeria a pena mata-lo. E, se não valesse, como dizer para o outro? Se realmente houve um sequestro, não duvidaria nem um pouco que Adam e Oliver poderiam acabar matando um ao outro.
Quando cheguei no beco, ele estava lá.
"Todd" fora como disse que se chamava quando eu o conheci, mas eu sabia que estava longe de ser o seu nome verdadeiro. Ele tinha pelo menos trinta anos, era um traficante bem informado.
Mesmo que afirmasse nunca ter usado drogas, eu desconfiava de que, pelo menos no seu passado, já havia se envolvido. Porém, nunca perguntei sobre isso.
Ele estava sentado numa cadeira do canto, junto de outros frequentadores mais jovens do beco. Jogavam cartas.
Charlotte: Preciso falar com você.
Não precisei me referir a alguém para Todd saber que era com ele. Imediatamente, se levantou e jogou uma combinação de cartas que deveria ser muito boa porque, assim que o fez, os outros jogadores reclamaram e começaram a recolher suas cartas para embaralhar novamente.
Nos sentamos perto da porta. Ele segurava um cigarro que ainda não havia sido aceso. Notei que estava se esforçando para não acende-lo, já que sabia que o cheiro e toda aquela fumaça não me agradavam.
Todd: Do que você precisa?
Mostrei a foto a ele e contei toda a história.
Todd: Eu realmente não ouvi falar de algum sequestro cometido por um velho, mas vou ficar atento.
Sorri, agradecida.
Ficamos ali por alguns minutos, em silêncio. Agora eu precisava pensar em um novo lugar para começar minha busca. Ainda não podia ir diretamente até Oliver.
Todd: Eu acho que conheço alguém que pode te ajudar.
Ele chamou um dos garotos pelo nome e pediu papel e algo que escrevesse. O menino cumpriu a ordem no mesmo instante.
Todd apoiou o papel na parede e desenhou algumas linhas. Apontou para um ponto no canto da folha.
Todd: Estamos aqui certo?
Concordei. Ele explicou o mapa pacientemente, chamando algumas ruas e esquinas pelo nome que usava durante seu trabalho. Fez um circulo em volta de um quadrado, indicando a casa que eu deveria achar.
Em seguida, contou sobre a pessoa que eu deveria procurar.
Todd: Seu nome é Santiago. Ele é meu informante. Quando recebo novos clientes, peço para ele verificar. Sabe como é, né?
Peguei o papel e coloquei no bolso de trás do meu jeans.
Charlotte: Obrigada, Todd.
Sai do beco e analisei o mapa. Pensei em ir até a delegacia para pegar uma arma, só para garantir, mas Alexander não gostava que eu entrasse e saísse muito, mesmo que meu quarto fosse separado de sua sala.
Resolvi ir direto até Santiago. Não era muito longe dali.
Notei que a casa do informante ficava num bairro em que a maior parte dos moradores eram espanhóis e mexicanos. Este bairro também era considerado "miserável" e "perigoso" pelos adultos que viviam uma vida relativamente boa, de forma que a maioria de suas crianças eram instruídas a ficar longe. Do meu ponto de vista, isso era besteira. Eu já havia estudado com uma moradora do mesmo bairro, e ela, por mais que fosse pobre, não era "perigosa". 
Caminhei pela rua. Até então, parecia um bairro calmo. Olhei o pequeno mapa e logo localizei o local.
Santiago vivia numa casa com uma boa aparência externa. Era de madeira, pintada de um leve tom de creme, com detalhes brancos nas janelas, que possuíam cortinas da mesma cor. Tinha uma pequena varanda de três degraus de altura que levava a porta de entrada.
Havia dois homens sentados na varanda, ambos com cigarros na mão. Foi quando um deles se curvou para pegar uma lata de cerveja no chão que notei que ambos estavam armados. Me arrependi de não ter ido até a delegacia, mas avancei em direção a casa mesmo assim.
Quando me aproximei, os dois homens imediatamente lançaram seus olhares em minha direção.
Charlotte: Eu preciso ver Santiago.
Eles se entreolharam. 
Primeiro homem: Não há nenhum Santiago aqui.
Apenas repeti a pergunta.
Eles começaram a sussurrar e então um deles gritou algo espanhol. Um homem de aparência semelhante aos dois primeiros afastou levemente a cortina com uma das mãos para observar o lado de fora, e então rapidamente se afastou. Segundos depois, pude ouvir o som da porta da frente abrir.
Os três começaram a conversar em espanhol, onde as únicas palavras que pude entender foram "ella" e "Santiago”.
Em seguida, o terceiro homem fez sinal para que eu entrasse. 
Os moveis velhos e manchados me lembravam um dos orfanatos em que vivi.
Passamos por um corredor empoeirado, mas barulhento, e fomos em direção a ultima porta do corredor, que estava entreaberta. 
O homem deu duas batidas na porta e logo a abriu num gesto para que eu entrasse.
Não soube dizer que tipo de cômodo aquele deveria ser. Havia cadeiras de plástico e mesas de madeira já estragada no local. Um homem com uma magreza quase que doentia estava sentado numa cadeira próxima à porta. Tinha cabelos loiros, mas desidratados, longos o suficiente para fazer um pequeno rabo de cavalo baixo.
Um segundo homem estava sentado mais ao fundo da sala, com os pés apoiados na mesa. Este tinha uma pele levemente bronzeada. Também era magro, mas usava uma regata branca que destacava seus músculos.
O homem loiro se levantou e, junto do meu "guia", se retirou da sala. Obviamente, aquele era Santiago.

Ele permaneceu com seu olhar fixo em mim. Depois de um tempo em silêncio, começou a fazer perguntas em espanhol.
Charlotte: Todd me mandou aqui. Eu sei que você fala a minha língua.
Santiago encarou o chão. Havia um sorriso malicioso em seus lábios.
Santiago: O que você quer?
De inicio, desconfiei por nem perguntar meu nome, mas então lembrei que Todd deveria ter uma grande influência sobre ele.
Pensei em enrolar um pouco, avalia-lo para ter certeza que era confiável, mas eu não tinha tempo.
Aproximei-me e tirei a foto do bolso jogando-a sob a mesa em que ele apoiava os pés. Santiago se ajeitou na cadeira, inclinando-se para observar a imagem. Notei que havia alguns anéis de ouro em ambas as mãos.
Charlotte: Preciso saber a história desses homens.
Ele permaneceu em silêncio, analisando a foto.
Santiago: Duas semanas.
Charlotte: 24 horas.
Ele soltou uma gargalhada sem humor enquanto se encostava na cadeira novamente.
Santiago: Escute querida, não tenho tempo para procurar a história de um trio de velhos apenas porque você quer. Eu tenho gente mais importante e útil para ajudar do que você.
Eu comecei a planejar uma ameaça, algo que não fosse partir para uma agressão física, até que prestei mais atenção em suas palavras.
Charlotte: Um trio? Mas há apenas duas pessoas nessa foto.
Ele apontou para um traço quase invisível de um dedo mínimo, exatamente onde a imagem fora rasgada. Junto de sua outra metade, formaria um terceiro homem. 
Santiago: Você não notou isso?
Neguei. Santiago suspirou.
Santiago: Vou fazer esse favor para você. Volte aqui amanhã, nessa mesma hora. 
Não pude deixar de sorrir.
Santiago: Não se sinta exclusiva, porque você não é... Seu nome?
Respondi educadamente, e logo caminhei até a porta.
Charlotte: Obrigada.
Santiago: Ei, querida, vai ficar me devendo um favor. É melhor não se esquecer disso.
Após essa fala, apenas me retirei. O homem que me levara até Santiago e o loiro esquelético esperavam encostados na parede, um de cada lado da porta. 
Apenas saí, dessa vez, desacompanhada, mas sabendo que os olhares me focavam. A segurança poderia até ser boa, mas nem um pouco discreta.
Agora, tudo o que me restava era esperar.
Ainda era cedo para voltar à delegacia, então resolvi andar um pouco pela cidade.
Não tinha bem um lugar específico para ir, até porque não tinha dinheiro nem para comprar uma bala.
Andei até o meu último orfanato. Era um prédio velho, e se não fosse pelos gritos das crianças, qualquer um diria que era um lugar abandonado.
Devo admitir que tive bons momentos ali, mas todas as crianças com quem me dava bem eram rapidamente adotadas, e os únicos adolescentes ali eram dois irmãos um ano mais velhos que eu, de forma que logo eles foram embora e acabei me tornando a órfã mais velha dali.
Continuei andando, passando por locais que frequentava depois da escola. Por algum motivo, Todd me veio na cabeça.
Desde que eu o havia conhecido, ele havia sido gentil, me defendendo quando ainda não havia conquistado o respeito e entendido as regras do beco.
Algo em que todos no "esconderijo" concordavam, era de que Todd possuía uma grande quantia em dinheiro, mas ninguém jamais descobrira onde ele morava.
Mesmo que eu não falasse o que acontecia comigo, ele sempre tentava me ajudar da melhor maneira possível. Era um garoto extremamente inteligente e, diversas vezes, me convidou para morar com ele. Neguei todas as vezes. 
Nunca entendi se havia alguma segunda intenção nisso, ou se era apenas um ato de amizade, mas preferia não arriscar.
Não sei por quantas horas eu andei, mas sei que já estava anoitecendo quando resolvi voltar para a delegacia.
A rua estava silenciosa, sem carros. Eu permanecia pensativa, relaxada, um jeito que eu não ficava havia muito tempo. Mas tudo mudou quando, enquanto passava por um beco, ouvi o som de uma lâmina e um grito, seguido de vários outros. Logo me lembrei do que ouvira na noite anterior.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Suspect - Capítulo 8: Coincidências

8. Sempre haverá uma saída
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Fiquei desconfiada no começo, mas algum tempo depois comecei a relaxar. 
Já se passava da meia noite, mas o restaurante continuava cheio. Scott e eu comparávamos nossas vidas. Scott sempre tivera muito dinheiro, enquanto eu tentava roubar alguns trocados de minhas responsáveis no orfanato, já que nenhuma nunca gostou muito de mim e "esqueciam" de preparar meu lanche.
Charlotte: Mas... Eu não entendo... Se você sempre teve tanto dinheiro, por que virar um assassino? Quer dizer, se você quisesse matar alguém, podia só contratar uma pessoa. 
Ele sorriu.
Scott: Minha história não é tão simples.
Charlotte: E qual é a sua história?
Ele contou que, com quinze anos, ajudou uma garota mais nova a fugir de um homem mais velho que estava a encurralando num beco. Ele matou o homem agilmente, e no dia seguinte, dois homens o seguiram e o sequestraram, de modo que pudessem testar suas habilidades que até então eram desconhecidas. Eles pediram para que Scott matasse um homem, e, após pensar muito, ele acabou concordando. Foi assim que começou no ramo.
Acredito que eu tenha ficado muito quieta após ter revelado seu passado, porque logo ele demonstrou curiosidade e diversão.
Scott: No que está pensando?
Charlotte: Eu tenho que admitir... Estou sem palavras. Quem diria que alguém como você se tornaria um assassino. 
Scott: Alguém como eu?
Charlotte: Sim... Veja, um garoto rico, provavelmente com uma boa família e uma vida que todos sonham em ter... Abandona tudo para matar pessoas.
Scott: Se você quer mesmo saber, eu não tive muita coisa para abandonar.
Ele bebeu um gole d'água. Já era tarde e dispensamos o vinho, pois nem eu e muito menos ele queríamos estar bêbados no fim da noite.
Charlotte: Como as...
Scott: Meus pais estão mortos, Charlotte, assim como todos os outros membros da minha família. Não há ninguém vivo, ao menos não que eu saiba, além de mim.
Senti seu humor mudar de repente. Não sabia se era raiva, ou desinteresse pelo assunto. Talvez não gostasse de falar sobre, ou apenas estivesse cansado, afinal, já era tarde. 
Ambos ficamos em silêncio após isso.
Charlotte: Desculpe... Acho que eu não devia ter comentado sobre isso...
Ele permaneceu em silêncio, seu olhar era vazio. Perguntava-me se ele realmente havia me ouvido.
Ficamos assim por longos e tortuosos dez minutos, até que ele se manifestou, ainda com sua expressão um tanto perdida.
Scott: Você quer mais alguma coisa? 
Neguei, um pouco confusa.
Scott: Então acho que já podemos ir, certo? Está tarde e tudo mais.
Concordei com um sinal afirmativo com a cabeça e esperei que pagasse a conta.
Ele se levantou e então fiz o mesmo logo em seguida. Andamos juntos, em silêncio, até a entrada do restaurante.
Parei em frente à calçada, enquanto ele caminhava até o estacionamento. Ele parou e se virou para me encarar.
Scott: Você não vem?
Neguei.
Scott: Não se faça de difícil. Você sabe que está tarde e cansada. A delegacia é longe daqui também, eu sei que quer uma carona.
Ele estava certo, eu queria. Mas, já sabia onde isso acabaria. Afinal, dois jovens, sem compromissos, num carro, sozinhos no meio da noite...
Charlotte: Outra hora, quem sabe.
Ele sorriu, um tanto forçado, parecia um pouco triste, talvez cansado, mas sorriu.
Scott: Quem sabe.
Então, fiquei parada observando-o sumir pela porta de vidro que levava até ao estacionamento.
Atravessei a rua, e andei preguiçosamente até a delegacia.
Com certeza, algo trágico havia acontecido com a família de Scott, e ele claramente não queria falar sobre isso. Mas, no geral, a noite foi interessante. Não só descobri mais sobre o garoto, como também me diverti muito. Quer dizer, sendo uma assassina e tudo o mais, você pode até frequentar bons lugares (graças as suas vítimas), mas, tendo uma pessoa em que você pode confiar e saber que quando acordar no dia seguinte ela não estará morta por sua causa, é algo bem confortável.
Faltava umas cinco quadras para que eu chegasse à delegacia, quando eu ouvi um grito. Parei e olhei para todos os lados em busca do som, mas como não achei algum sinal, ignorei e continuei meu caminho.
Quando cheguei à delegacia, fui ignorada pelos policiais de plantão, que estavam visivelmente cansados. Dirigi-me ao meu quarto e então me preparei para dormir. 
Eu estava inquieta, mas de alguma forma, consegui dormir rapidamente.

Por algum motivo, acordei cedo sem ficar cansada. 
Às nove horas eu iria me encontrar com um novo cliente. Seu nome era Adam Lewis. Ele queria que eu o encontrasse em sua casa, mas disse que não seria possível, então resolvemos marcar no centro da cidade, em frente a uma loja de moveis. 
Cheguei ao local alguns minutos antes, e fiquei na porta esperando o senhor. Mesmo sendo cedo em pleno dia de semana, aquela parte da cidade continuava agitada. Adolescentes (que deviam estar na escola há essa hora) andavam em grupos de três a quatro pessoas, enquanto mulheres que aparentavam ser secretárias corriam com copos de café em direção aos prédios comerciais. 
Um homem caminhou em minha direção, parando ao meu lado. Não era gordo nem magro. Possuía cabelos grisalhos, assim como o seu bigode. Sua pele era enrugada. Vestia uma blusa polo laranja e uma bermuda caqui, que não combinavam com os seus chinelos claramente gastos. Usava também um chapéu de palha. Parecia inofensivo, não tinha cara de que queria matar alguém. E então ele se aproximou.
Homem: Você é a Charlota?
Dei-lhe um sorriso forçado.
Charlotte: Meu nome é Charlotte. Você deve ser o Adam, certo?
Ele confirmou com um sorriso e esticou sua mão para um cumprimento.
Adam: Vamos, Charlota, por que não tomamos um café enquanto conversamos?
O homem saiu sorridente em frente. 
Fiquei um tanto surpresa com o animo do homem, mas continuei o seguindo até uma confeitaria pequena que fora aberta poucos minutos antes de nossa chegada. No caminho, Adam puxou diversos assuntos. Desde "o porquê de o céu ser azul" até assuntos como política.
Sentamo-nos numa mesa do lado de fora da confeitaria. Pessoalmente, preferia um lugar que fosse menos visível, mas achei que uma vez ou outra não faria mal mudar um pouco.
Pedi um café preto, e ele um cappuccino e um pedaço de torta. Esperamos em silêncio até nossos pedidos chegarem.
Observei, nesse curto tempo, que ele observava a rua com atenção, sempre sorrindo. Como se algo naqueles prédios comerciais ou nas pessoas que passavam lhe trouxessem boas lembranças.
A garçonete trouxe nossos pedidos, e esperamos que fosse embora para que começássemos o assunto.
Ele tomou um gole do cappuccino, que viera com o desenho de uma flor.
Adam: Preciso que você mate o meu amigo.
Seu rosto sorridente mudou para uma expressão séria e fria.
Charlotte: Senhor, não é tão simples.
Ele permaneceu em silêncio.
Charlotte: Por que não começa dizendo quem é seu amigo?
Ele voltou a olhar para a rua, mas já não sorria mais.
Adam: Nós crescemos juntos, e fomos para o exército juntos. Há alguns anos... Ele se meteu com o tráfico de drogas, lucrou muito...
Comecei a pensar em como dizer a ele que eu não podia matar um traficante de drogas. 
Havia um acordo entre os traficantes e mafiosos do beco e eu. Não iriamos interferir nos trabalhos uns dos outros. Se fosse extremamente necessário, deveríamos conversar e negociar. Não importaria se eram especificamente eles, ou outros que não frequentavam o local, pois hora ou outra ficariam sabendo. E isso traria muitos problemas.
Adam: ...Até que ele começou com um novo tipo de trabalho. Ele começou a traficar órgãos.
Uma pessoa que segue uma vida normal ficaria chocada, mas eu já estava acostumada. Já havia matado pessoas com carreiras semelhantes.
Adam: Não vou mentir, não gostei da nova profissão dele, mas tentei fingir que ele não fazia nada daquelas coisas e evitava conversar sobre esse assunto. Mas, as coisas ficaram mais sérias...
Charlotte: Você pode ir direto ao ponto?
Ele ficou em silêncio e continuou a observar a rua.
Adam: Ele quer matar minha neta, e a mim também. 
O motivo pelo qual Adam queria a morte do amigo já estava claro: ele queria se prevenir. Sabia que ia ser assassinado e precisava se cuidar.
Charlotte: Desculpe, mas não entendi a relação da sua neta com tudo isso.
Ele quis gritar, mas não podia. Demonstrou sua raiva num tom baixo, extremamente irritado.
Adam: Ele vai mata-la para pegar seus órgãos!
Charlotte: E você? Por que ele o mataria? Por defender sua neta?
Ele me encarou. Estava nervoso, mas respondeu calmamente.
Adam: Não. Ele vai me matar porque eu sei demais, e sabe que não apoio seu trabalho. Sabe que vou entrega-lo se machucar a minha família!
Respirei fundo. 
Charlotte: Senhor Lewis, entendo totalmente o seu lado. Entendo que você quer proteger sua neta e a si mesmo, mas precisarei de um tempo. Dê-me algo para que eu possa identificar seu amigo e então eu verei se mata-lo realmente é a melhor escolha.
Seu rosto estava vermelho. Ele tirou a carteira do bolso e começou a resmungar.
Adam: Você acha que eu tenho tempo? Eu não posso morrer, não agora que...
Adam parou de falar e tirou uma foto dobrada da carteira. Jogou-a sobre a mesa. Mesmo sem poder ver a imagem, era fácil perceber que era uma imagem antiga e que havia sido muito manuseada.
Estiquei o braço para pegar a foto e então a desdobrei. 
Havia dois homens com aparência de seus trinta anos, encostados em um muro. A foto estava rasgada do lado direito, como se faltasse um pedaço dela. 
Olhei para o homem da esquerda e depois para Adam. Mesmo com grandes mudanças em seus traços, ainda era possível identificar qual deles era o senhor na foto. 
Agora, ele olhava para a rua. Pela primeira vez, me virei para observar a mesma coisa que ele. Notei que o muro da igreja próxima a um dos prédios comerciais era o mesmo da foto. Com uma nova pintura, mas era o mesmo. Ficamos um tempo observando em silêncio.
Adam: Eu vou embora agora.
Ele se levantou, sorrindo novamente. Permaneci sentada.
Charlotte: Espere... Você não me deu um nome!
Adam se virou e sorriu.
Adam: Eu não lhe contei? Ele foi dado como morto. Ninguém sabe que está vivo. Ele usa apenas pseudônimos agora, e não me contou nenhum.
Aquilo seria um problema. Um enorme problema.
Adam: Até mais, Charlota.
Ele se virou e andou até a saída. Queria pedir para ficar e me dizer o nome de seu amigo mesmo assim, mas algo me dizia para não fazer isso. Permaneci sentada, observando muro, pensativa. Estava tão concentrada, que só notei a presença de Scott quando ele me chamou pelo nome.
Scott: Charlotte.
Virei-me. Ele estava sentado a minha frente, no lugar de Adam.
Confesso que não esperava vê-lo tão cedo. Quer dizer, eu sabia que ele me procuraria para falarmos sobre Cristopher, mas... Já?
Notei que suas expressões eram de desconfiança e seriedade.  Expressões que eu ainda não havia visto vindo dele.
Scott: Sobre o que você estava conversando com a minha vítima?
Eu ainda estava pensando na história de Adam. Não estava muito concentrada nas palavras de Scott... Até que ele disse "vítima".
Minhas palavras soaram vazias.
Charlotte: Sua o quê?  


terça-feira, 19 de agosto de 2014

Suspect - Capítulo 7: Missão concluída

7. Sempre haverá uma saída
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Menina: Não... Por favor...
Seu desespero era totalmente visível.
Toquei o braço de Scott em sinal para que ele abaixasse a arma. Em seguida, fui em direção à garota.
Charlotte: Vai ficar tudo bem agora, certo? Vamos tirar você daqui.
Ela se agarrou em mim e continuou a chorar. Abracei-a, tentando acalma-la.
Scott começou a tocar as paredes, procurando o interruptor para acendermos as luzes. Voltei minha atenção para a garota no meu colo.
Charlotte: Você é a Estela, não é?
Ela se afastou. Parecia estar começando a se acalmar — um sinal de que estava começando a confiar em nós , mas as lagrimas ainda corriam pelo seu rosto.
Menina: Quem são vocês? Como sabe quem eu sou?
Apenas sorri.
Charlotte: Explicaremos tudo mais tarde.
Perguntei se tinha algo para vestir, e ela confirmou. Enrolada no lençol, foi até uma porta e sumiu atrás dela. 
Charlotte: Como tiramos ela daqui?
Scott, que analisava uma das paredes, se virou para me encarar.
Scott: É arriscado levarmos ela por aqueles corredores.
Charlotte: Mas... Tem outra saída?
Scott: Nem saídas, nem janelas. Nada.
Me sentei na beira da cama, pensativa. Não podíamos abrir mão de tudo agora, e se fossemos por aquele caminho, as chances de sairmos de lá feridos era enorme.  Até que eu tive uma ideia.
Charlotte: E se eu chamar Alexander?
Ele me encarou como se eu fosse louca.
Scott: Do que isso vai adiantar? Se ele trazer meia dúzia de tiras aqui só vai chamar atenção, e é capaz de alguém ser morto. Estamos lidando com um pessoal experiente, Charlotte.
Permaneci em silêncio. Se ele estivesse certo sobre as pessoas com quem estávamos lidando, isso significaria que a nossa missão era mais difícil do que eu  havia imaginado.
Estela retornou ao quarto, agora vestida. Lancei um olhar questionador a Scott. O que faríamos agora? O que diríamos a ela? Se começássemos a discutir ali, ela ficaria assustada. Ele suspirou.
Scott: Tudo bem, vá. Seja rápida.
Antes de ir, me aproximei de Estela, que parecia estar nervosa com a presença de Scott. Não a culpava, já que passou seis anos de sua vida presa, sendo abusada por uma pessoa que jamais conhecera.
Charlotte: Vou chamar algumas pessoas para tirarmos você daqui em segurança, ok? Scott vai proteger você, não tenha medo dele.
Ela confirmou em silêncio, e então saí. Pude ouvir Scott dizer "tenha cuidado" no momento em que passei pela porta.
Fiz o mesmo caminho para sair, porém, com um pouco mais de pressa. Notei que os gritos atrás das portas estavam mais altos, e os choros também. Provavelmente, voltar seria um problema.
Depois de passar por todas as portas e corredores, consegui sair de baixo do prédio. Procurei o telefone público mais próximo e disquei o número do celular de Alexander. Ele me atendeu com uma voz cansada.
Alexander: Quem é?
Charlotte: Alexander, eu preciso de ajuda.
Alexander: Espere... Charlotte? De onde você está me ligando?
Charlotte: Isso não importa agora. Eu achei a menina, mas não vou conseguir tirar ela daqui sem reforços.
Ele perguntou onde eu estava, e então li em voz alta o endereço de uma placa na esquina.
Charlotte: Sejam discretos! E... Seria bom se você me trouxesse alguma arma de fogo.
Pude ouvi-lo suspirar no telefone.
Alexander: Vou ver o que posso fazer.
Em seguida, ele desligou. Agora, eu só deveria esperar.
Comecei a pensar no local. Uma pessoa descuidada seria facilmente descoberta ali. Afinal, não havia ninguém para avisar quando chegasse algum policial. A não ser, claro, que tivessem câmeras. 

Câmeras. Eu não havia notado nenhuma, mas poderiam tê-las escondido bem. Podiam ser pequenas e discretas. 
Mas se fosse assim, teriam visto e se manifestado quando eu e Scott achamos Estela. Podiam ter me impedido de sair. Provavelmente, eles não tinham uma boa segurança. 
Depois de pensar muito nisso, fiquei preocupada o suficiente para achar os vinte minutos que Alexander levara para chegar agonizantes. 
Eram em torno de dez homens. Eles saíram do carro em silêncio, um por um. Todos devidamente equipados com armas grandes, coletes à prova de balas e capacetes, Alexander e seu reforço estavam prontos para qualquer coisa que estivesse nos esperando. Percebi que aguardavam as ordens do delegado. Em vez disso, eu que me manifestei.
Charlotte: A partir desse momento, vocês seguirão minhas ordens. Me sigam, em silêncio. Não toquem nada, e não sejam vistos de maneira nenhuma. A menina que devemos salvar está sob a guarda de um... Colega de trabalho meu, por tanto, não atirem nele.
Me aproximei de Alexander e estendi a mão. Ele me entregou um revolver. 
Por alguns segundos, fiquei encarando sua arma e a minha.
Charlotte: Não tinha nada... maior?
Alexander: Não reclame. Vamos acabar com isso logo.
Suspirei e então mandei-os me seguir.  Fomos até os fundos do prédio e abri a porta para o porão. 
Fui na frente, com Alexander sempre atrás de mim. Esperei que todos os outros descessem e fechassem a porta para continuarmos.
Rapidamente, chegamos no local marcado com um "X" vermelho. Fiz um sinal para que todos permanecessem em silêncio, e então fomos.
Seguindo a mesma estratégia de Scott, não foi preciso pedir que se dividissem entre os corredores. 
Prestando atenção em todos os movimentos e sons, rapidamente chegamos ao local onde Scott estava com Estela.
Charlotte: Fiquem aqui e vigiem. Alexander, você vem comigo.
Abri a porta, que estava levemente encostada. A única iluminação era do fogo que saia do isqueiro de Scott.
Estela estava sentada na cama, e Scott no chão, ao lado dela.
Charlotte: Tudo bem aqui?
Scott se levantou.
Scott: Dentro do possível, sim. 
Charlotte: Então, acho que podemos ir.
Me aproximei de Estela.
Charlotte: Temos dez policiais lá fora, todos para te proteger. Você está segura agora.
Ela segurou minha mão e se levantou. Scott apagou o isqueiro.
Charlotte: Vamos.
Só precisei me aproximar da porta para ouvir o som do primeiro tiro, seguido de vários.
Fechei a porta, deixando apenas uma fresta para que eu pudesse ver o que estava acontecendo.
Encarei Alexander.
Charlotte: O que fazemos agora?
Ele pediu licença e abriu um pouco mais a porta. Em seguida, gritou alguns números.
Três ou quatro homens apareceram na porta. Trocavam tiros com os "funcionários" do local. Suas posições sugeriam que saíssemos enquanto tínhamos chances.
Alexander foi na frente, e então puxei Estela pelo braço, guiando-a no meio do tiroteio. Scott foi atrás. Corremos o máximo que podíamos, e, de nós quatro, Scott foi o único que precisou usar a arma. 
Quando conseguimos fugir do tiroteio, vi os homens de Alexander nos seguindo, mas ainda se defendendo.
Paramos de correr quando alcançamos o carro em que Alexander havia chego e entramos nele. Enquanto esperávamos sua equipe, ele analisou Estela.
Alexander: Você está bem?
Ela fez um sinal positivo com a cabeça. Estava claro que não era acostumada a correr.
Sentei na frente, junto de Alexander, enquanto Estela ia no banco de trás. Scott, que estava encostado na porta, hesitou em entrar, mas acabou nos acompanhando até a delegacia.
Quando chegamos, pude notar que ela olhava tudo o que estava a sua volta com fascinação. Estela ficou seis anos sem ver a luz do dia, literalmente.
Nós quatro fomos até a sala de Alexander, e enquanto ele servia um copo d'água e a interrogava, eu liguei para Thomas do celular de Alexander. Percebi que Scott estava ao lado da porta, observando tudo o que acontecia, um tanto deslocado talvez.
Thomas: Alô?
Charlotte: Thomas, sou eu, Charlotte. Você deve se lembrar de mim, não é mesmo?
Thomas: Eu lembro! Você já achou algo?
Charlotte: Eu achei sua filha.
Ele ficou surpreso e excitado. 
Thomas: O que? Como? Ela está viva? Espere, espere! Não diga nada, estou indo ai agora mesmo!
Em seguida, ele desligou.
Devolvi o celular para Alexander e me sentei na cadeira ao lado de Estela. Scott se aproximou, se apoiando na mesa do delegado.
Charlotte: Boas noticias! Seu pai está vindo.
Seus olhos se encheram de lágrimas.
Estela: O meu pai?
Fiz um sinal positivo com a cabeça, e então ela abriu um sorriso de orelha a orelha e me abraçou.
Agradeceu diversas vezes, até seu pai chegar.
Sem pedir licença, abriu a porta da sala de Alexander. 
Thomas: Estela?!
Ela se virou para a porta, e ao ver o pai, correu para abraça-lo. Era uma cena linda e entediante.
Thomas interrompeu o abraço e veio até nós três. Agradeceu a todos, inclusive a Scott.
Ele chorava como uma criança, estava verdadeiramente feliz.
De mãos dadas com Estela, os dois saíram pela porta. Tinham muito assunto para por em dia.
Alexander: E essa é Estela. Sequestrada há seis anos. Nunca dormiu com seu sequestrador porque ele foi assassinado antes de poder conhece-la pessoalmente. 
Charlotte: Isso significa que...
Alexander: Exatamente. Alguém assumiu o lugar dele.
Suspirei.
Charlotte: Espero que ela consiga ter uma boa vida agora.
Ficamos em silêncio por algum tempo.
Scott: Acho que devo me retirar agora.
Ele caminhou até a porta, e antes de sair se virou para me encarar.
Scott: Até logo, Charlotte.
Scott sorriu, e em seguida simplesmente saiu pela porta, a qual Alexander ficou encarando por alguns segundos após a saída do garoto.
Alexander me encarou.
Alexander: Pretende me contar, ou...
Encarei o teto.
Charlotte: Mais tarde, talvez.
Então, houve uma batida na porta. Já sabia que o delegado voltaria ao trabalho, então, sem dizer nada, voltei para o meu quarto.
Ao abrir uma das gavetas da cômoda, achei minha agenda por acaso. Colocando minha pequena faca sobre a cama, peguei a caderneta e a folheei até achar o dia em que estávamos.
E então vi que eu tinha uma reunião marcada com um possível novo cliente em poucas horas, num restaurante chique. Obviamente, eu havia esquecido de tal compromisso.
Comecei a ler minha anotação. 
O cliente não mencionara nenhum nome, nem mesmo seu, mas para que eu pudesse encontra-lo, me deu sua descrição: cabelos curtos e escuros, assim como os olhos. Pele clara, e vestiria roupas escuras. 
Garantiu que eu o reconheceria de cara. 
Suspirei. Olhei no relógio, que marcava cinco horas em ponto. O jantar seria às oito horas. Resolvi que descansaria até as seis, e depois começaria a me arrumar.
Guardei minha faca e deitei sobre a cama, e ali adormeci até as exatas seis horas, quando meu despertador tocou.
Preguiçosamente, me levantei.
Anotei o endereço do local num pedaço de papel, e então me arrumei da melhor maneira que pude.
Resolvi que, dessa vez, chamaria um táxi.
Bati na porta da sala de Alexander, e percebi que estava vazia. Liguei para uma companhia de táxis aleatória, que achei na lista telefônica, e então só tive que esperar na frente da delegacia.
Por mais que o automóvel tenha chego rápido, o salto já estava me cansando.
Entrei no veículo e aguardei a chegada ao restaurante em silêncio.
O motorista também não puxara algum assunto, pois ligara o rádio numa estação que narrava algum esporte que não consegui reconhecer, pois o narrador falava rápido demais.
Levou um pouco mais de quinze minutos para chegarmos. Paguei o taxista, e então entrei no restaurante.
Olhei em volta. Havia vários homens de olhos e cabelos escuros, mas poucos usavam roupas escuras.
E então, no meio de todas aquelas mesas ocupadas e garçons correndo com os pratos, eu o avistei, sorrindo para mim.
Andei em direção a mesa em que estava. Ele se levantou para puxar a cadeira para mim.
Sentei-me. Ainda em pé, ele chamou um garçom que se aproximava e pediu vinho. 
Ficamos em silêncio até sermos servidos.
Quando o garçom foi embora, resolvi falar algo.
Charlotte: Isso é algum tipo de brincadeira?
Ele parecia se divertir, enquanto eu começava a me irritar.
Scott: Não fique brava. Apenas aproveite a noite.
Ele sorriu, e em seguida bebeu mais um gole de seu vinho branco.

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Suspect - Capítulo 6: X

6. Esteja sempre atento às pessoas a sua volta
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Charlotte: Você tem certeza que é aqui?
Era quase meia noite quando paramos em frente à suposta casa do médico que foi subornado pela mãe de Estela.  
Scott: Se não fosse, não estaríamos aqui.
Observei que não havia algum portão ou muro. Era apenas um enorme jardim, com um caminho de pedras em direção à porta de uma bela casa. 
Scott foi na frente. Notei que estava extremamente confiante, ao contrário de mim. Paramos na frente da porta, e então ele apertou a campainha.
Eu estava um tanto nervosa. Como perguntaríamos a ele? "Ei, por algum acaso você é um médico que foi subornado pela mãe de uma traficante?" Isso me parecia um tanto arriscado.
Mesmo que eu morasse numa delegacia, ser encontrada pela polícia era algo extremamente arriscado. Eram poucos os que me conheciam, então caso eu fosse pega por algum outro policial, poderia não só acabar com a minha carreira — e vida , como poderia acabar com toda a vida de Alexander. Ele poderia até 
não ser preso, mas com certeza esse ato de proteção viraria noticia. As chances dele
conseguir um bom emprego seriam quase nulas, e eu não queria isso.
Um homem beirando seus cinquenta e sete anos atendeu. Não pude observa-lo muito bem, pois, assim que abriu a porta, Scott acertou-o com um soco, fazendo seu nariz sangrar. O homem cambaleou para trás, e então pudemos entrar na casa. 
Fiquei um tanto abismada com Scott. Quer dizer, o homem não havia feito nada para merecer um soco em vez de um "olá".
Charlotte: Qual a necessidade disso?
Ele se virou para me encarar.
Scott: Para o nosso problema? Nenhuma.
O homem estava visivelmente irritado. Tinha cabelos grisalhos, vestia um roupão velho. Observei que havia algumas garrafas de bebidas empilhadas num dos cantos, todas vazias.
Homem: Quem diabos são vocês?
Scott sorriu. Era interessante, e ao mesmo tempo assustador ver aquele lado "maligno" dele. Não era muito diferente de mim. Mas, achei um pouco desnecessário golpear o homem antes mesmo de sermos cumprimentados.
Scott: Não se lembra de mim, doutor Cosac?
O homem analisou Scott de cima a baixo, e em seguida negou. Pela a expressão em seu rosto, por um momento achei que estava mentindo. 
Scott: Estou surpreso. Deixe-me ajuda-lo a lembrar.
Em seguida, Scott empurrou o doutor num sofá que, até então, eu não havia notado que estava ali. 
Ele soqueava o homem com uma verdadeira raiva, de modo que fez com que eu me aproximasse para separa-los.
O homem se levantou, com dificuldade.
Cosac: Você não mudou mesmo, Scott.
Scott quis avançar no homem novamente, mas eu o impedi. Estava claro que algo havia acontecido entre eles.
Charlotte: Quem é ele?
Scott: Ele ameaçou a Fire. Fez com que ela lhe desse drogas de graça e ainda abusou dela!
Cosac ria com as acusações de Scott.
Cosac: Ah Scott, foi isso que ela te contou? Acredite: ela que se ofereceu.
Ele fez uma pausa. Scott estava mesmo irritado, e Cosac parecia estar adorando aquilo.
Cosac: Quer saber? Vou te contar o que aconteceu. 
Cosac tirava o excesso de sangue do rosto com as mãos. Ele se sentou, e com um gesto, pediu para que nós fizéssemos o mesmo, mas permanecemos em pé. 
Cosac: Eu comprei muito dela, muito mesmo. Eu sabia desde a nossa primeira noite, que tudo o que ela queria era o meu dinheiro. Mas, fazer o quê? Não é sempre que temos alguém como Fire a nossa disposição. Nosso "relacionamento" acabou quando ela percebeu que eu menti, dizendo que não sabia muito sobre o que aconteceu com a mãe dela. 
Vi que a expressão de raiva no rosto de Scott mudou para compreensão, e em seguida raiva novamente, provavelmente por ter sido enganado.
Ficamos em silêncio por um tempo.
Cosac: Mas não foi por isso que vocês vieram aqui. 
Encarei Scott, esperando que ele perguntasse algo relacionado ao nosso pequeno problema, mas ele ainda parecia estar meio em choque.
Sentei-me numa poltrona perto do sofá onde estava o doutor.
Charlotte: Soube que você fez o parto da mãe de Fire.
Ele sorriu e concordou.
Charlotte: Fire... Qual o nome verdadeiro dela?
Cosac: Você quer saber se ela tem uma irmã, certo?
Não pude evitar me impressionar.
Cosac: Eu estou ficando velho, mas não sou bobo. Aliás, não me lembro de você.
Charlotte: É porque o senhor nunca me viu. Me chamo Charlotte.
Conversamos um pouco. Ele perguntou o que eu fazia, e disse que era do mesmo ramo de Scott.
Cosac: Bom, Charlotte, contarei o que você quer.
Scott, que parecia ter saído de seus pensamentos, sentou ao lado do doutor.
Cosac: Eu e a mãe de Fire nos tornamos amigos quando estávamos nos últimos anos de escola. Alguns dias depois da nossa formatura, ela perguntou o que eu iria fazer. Respondi que tentaria a faculdade de medicina, e quando eu fiz a mesma pergunta, ela me contou tudo. Havia conhecido um garoto da nossa idade, que disse que se ela o ajudasse, ficaria rica. Era um traficante. Alguns anos se passaram e eu me formei. Um dia, ela me ofereceu maconha. Obviamente, eu neguei. Ah... Aquilo se repetiu tantas vezes... Um dia eu aceitei e acabei sendo levado pelo vício. Foi um erro meu, mas ninguém sabia além dela. Quando ela engravidou, eu fiquei surpreso. Ela casou logo depois. 
Ele fez uma pausa, para garantir que estávamos ouvindo.
Cosac: Nós dois conseguimos parar com o vício juntos. Sabe, eu conheci o marido dela. Um homem incrível, que estava verdadeiramente apaixonado por ela. No dia que ela teve as crianças... Ela pediu para que eu dissesse que ela estava morta. Ela levaria uma das crianças, e a outra deveria ficar com o pai. Ela implorou para que eu não contasse para ninguém. Nunca me disse o motivo, mas eu já sabia que ela havia voltado a se drogar. Fire, por outro lado, nunca se drogou. Lembro como se fosse ontem, Fire com seus sete anos, batendo na minha porta pedindo abrigo por uma noite. A mãe havia morrido num tiroteio com uma gangue. Mesmo eu dizendo que não precisava, ela disse que voltaria para onde estava morando, e só queria ficar longe por um dia, para garantir que não seria atacada de surpresa. Depois disso, parei de vê-la. Quando minha esposa me deixou, voltei a usar drogas, e acabei encontrando-a, mas ela não me reconheceu de primeira. Foi então que tudo aconteceu. Ela mudou muito desde que era uma pequena criança. 
O silêncio dominou a sala por alguns minutos.
Então Fire tinha uma gêmea, e provavelmente não sabia disso. O pai também não sabia de Fire, o que poderia deixar as coisas mais fáceis.
Cosac: Caroline. Uma vez, num jantar com Thomas e Mirian, a mãe de Fire. Eu perguntei que nome dariam se fosse uma menina. O pai queria Estela e a mãe queria Caroline. Quando ela fugiu com Fire, deu esse nome a ela. Nunca mais vi o pai, mas acredito que tenha dado o nome de Estela para a outra.
Sorri.
Charlotte: Ele deu.
Scott se levantou e eu também. Cumprimentamos o doutor, e Scott pediu desculpas.
Depois de uma longa despedida, saímos da casa. Paramos em frente ao jardim.
Scott: Você vai atrás de Estela amanhã?
Charlotte: Provavelmente.
Scott: Então onde nos encontramos?
Eu já esperava por isso.
Charlotte: Quem disse que quero sua ajuda agora?
Scott: Ah, então você sabe onde Estela está?
Encarei-o, curiosa.
Charlotte: Você sabe?
Ele olhou para o céu, e em seguida para mim novamente.
Scott: Acredito que sim.
Hesitei. Queria resolver isso sozinha, mas a ajuda de Scott estava sendo extremamente útil.
Charlotte: Amanhã, no parque que fomos hoje, às treze. Não se atrase.
Ele concordou.
Quando me virei para ir embora, ele segurou meu braço.
Scott: Sem um beijo de boa noite?
Sorri. Aproximei-me dele, que logo soltou meu braço, colocando suas mãos em minha cintura.
Sussurrei em seu ouvido.
Charlotte: Exatamente.
Então, empurrei-o e em seguida o chutei. Não vi onde acertei, mas percebi que havia causado muita dor. 
Me afastei.
Charlotte: Boa noite, Scott.
Enquanto eu ria, pude escuta-lo me xingar.
No caminho, fiquei pensando nele. Scott apareceu do nada, sabendo muito sobre mim, e queria minha ajuda para achar Cristopher. Com isso, ele me ajudaria a achar Estela, como prova de que poderia confiar nele. 
Até então, ele havia se mostrado um homem de bom caráter, mas eu ainda desconfiava dele.
Talvez, fosse questão de tempo. Desde aquele dia com Cristopher, eu nunca mais tive algum amigo, além de Alexander, que estava sempre ocupado.
A namorada do delegado, porém, era uma menina de idade aproximada, com uma personalidade gentil e confiante. Ela me conhecia, mas Alexander havia me proibido de sair com ela, dizendo que eu poderia acabar colocando-a em problemas. No final, as únicas pessoas com quem eu realmente convivia, eram os frequentadores do beco.
Eram quase duas horas quando eu cheguei na delegacia. Havia apenas dois policiais, que me cumprimentaram quando apareci na porta.
Passei pelo corredor espelhado da sala de Alexander, e então entrei no meu quarto.
A primeira coisa que fiz foi tirar as botas. Meus pés doíam, e então notei que estavam cheios de bolhas.
Murmurei um pequeno palavrão.


No dia seguinte, acordei por volta das dez. Aos poucos, comecei a me lembrar do dia anterior. Fora cansativo, porém revelador. Graças a Scott, o caso de Estela seria resolvido facilmente. Então, lembrei do acordo.
Em troca da ajuda de Scott, começaríamos a trabalhar juntos para achar Cristopher. Algo ainda me deixava inquieta em relação a isso. Ainda não entedia no que eu seria útil, já que ele sabia tanto.
Me arrumei, vestindo um jeans velho e um par de tênis confortáveis — os mesmos que eu usava quando perseguia alguém — acompanhados de alguns band-aids. Vesti uma regata branca e minha jaqueta preta. A manhã estava um pouco quente, mas preferi não arriscar passar o resto do dia com frio. 
Abri uma das gavetas do pequeno armário ao lado de minha cama. Ali, eu guardava algumas armas, como facas, canivetes e qualquer coisa que cortasse ou causasse um bom dano físico nas pessoas.
Peguei uma das facas pequenas. Elas tinham o tamanho perfeito para ficarem no bolso da jaqueta despercebidas, e ainda assim, causavam um grande estrago. Com certeza, era uma das minhas preferidas.
Olhei os números do despertador que ficava em cima da cômoda, e notei que apenas uma hora havia se passado. Deitei-me novamente e fiquei a espera de Alexander para me chamar para almoçar, como fazia todos os dias. 
Normalmente, Alexander e eu almoçávamos numa lanchonete próxima, ou ele trazia algo para mim e passava essa hora com a namorada. A mesma coisa acontecia com o jantar.
Era meio-dia quando ele bateu na minha porta. Eu estava quase cochilando.
Levantei-me rapidamente e a abri.
Alexander: Pronta?
Assenti.
Andamos até a lanchonete e nos sentamos. Era um lugar pequeno, e o dono ao nos ver, trouxe o nosso prato de sempre: dois hambúrgueres completos.
O dono era um homem quase aposentado, que gostava do que fazia. Conhecia Alexander desde que ele havia conseguido o cargo de delegado.
Enquanto comíamos, Alexander tentava puxar assunto.
Alexander: Quem vai perseguir hoje?
Charlotte: Ninguém. Vou atrás de Estela.
Eu estava falando a verdade. Mas por algum motivo, ele ficou desconfiado.
Alexander: E o que mais?
Charlotte: Nada. Por que teria um "mais"?
Ele me encarou de maneira séria.
Alexander: Não virei delegado brincando, Charlotte. Você está escondendo algo.
Enquanto mastigava, fiz um sinal negativo com a cabeça.
Charlotte: Façamos o seguinte: quando eu terminar, você descobrirá.
Ele suspirou.
Alexander: Não gosto de surpresas...
Charlotte: Talvez essa seja boa! Se anime!
Ele me ignorou e voltou a comer. 
Faltavam quinze minutos para eu encontrar Scott, quando Alexander recebeu uma ligação. Após termina-la e dizer que precisava voltar para a delegacia, ele se despediu e seguiu em direção ao trabalho. Resolvi fazer o mesmo, então fui andando depressa até o parque.
Enquanto me dirigia até o lugar onde havíamos ficado na noite anterior, vi Scott se aproximando. Ele vinha da direção oposta.
Scott: Você é bem pontual.
Charlotte: Parece que posso dizer o mesmo de você.
Ele sorriu, mas logo ficou sério.
Scott: O que você sabe sobre o sequestrador de Estela?
Charlotte: Sei que ele está morto. E que foi assassinado por Cristopher.
Scott: Ótimo, então não preciso explicar nada. Vamos?
Acompanhando seus passos, fomos em direção à saída do parque, que foi pela qual eu havia entrado.
Então, diferente da nossa ultima caminhada, nós tentamos puxar assunto. Começamos por um "qual a sua idade?" — ele também tinha 23, mas era alguns meses mais velho — e acabamos quando, ao esperar o sinal para pedestres ser aberto, ele colocou um de seus braços em volta do meu ombro e começou a mexer na minha jaqueta.
Charlotte: O que diabos está fazendo?
Ele respondeu pausadamente, prolongando a ação.
Scott: Nada... importante...
Notei que ele tentava observar além do decote da minha regata.
Charlotte: Scott, você gosta desse braço?
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, e então, num sussurro, fez uma pergunta.
Scott: Você veio armada?
Fiz um movimento positivo com a cabeça, e logo ele largou minha jaqueta, colocando suas mãos no bolso da calça jeans escura, como se nada tivesse acontecido.
Segurei o riso, mas ainda assim ele notou meu divertimento com sua reação.
O sinal logo ficou verde, e então andamos até um prédio abandonado. Paramos em frente a ele.
Charlotte: Eu acredito que haja gangues aqui... Mas... Scott, ele era um profissional.
Scott: Exatamente, e por isso seu "escritório" é de baixo desse prédio.
Andamos até os fundos do prédio, e então Scott pegou um pedaço de madeira jogado num canto.
Com agilidade, ele logo tirou do meio da terra uma corda. Ele a puxou, e então uma porta se revelou, disfarçada com blocos de grama sob ela.
Charlotte: Como você descobriu isso?
Scott: Ajudei Fire numa entrega aqui.
Ele fez sinal para que eu entrasse, e então obedeci. 
A escada era semelhante a do beco, porém, mais curta.
Scott veio logo em seguida, e então fechou a porta. Logo, comecei a sentir o calor do lugar. Tirei a jaqueta e a amarrei na cintura. Scott assobiou. Eu ia xinga-lo, mas antes que eu pudesse me manifestar, ele fez um sinal para falarmos baixo. 
Ele foi na frente, me guiando pelo lugar.
Era realmente grande, e quando escutávamos sons de passos, nos escondíamos entre os corredores.
Depois de andarmos muito, encontramos uma parede com uma única entrada. Não havia porta, ou alguém vigiando. Era apenas uma parede, com um "x" de cada lado da entrada, pintados da cor vermelha.
Scott: Fique atenta.
Scott retirou o revolver das costas, e eu peguei minha faca. 
Passamos pela entrada, e então vi vários corredores com a mesma pintura. Enquanto andávamos, pude notar que havia um tipo de sequência: um corredor, uma sala, um corredor. Todas as salas tinham portas velhas.
Andamos entre corredores, cada um de um lado. De algumas salas, podíamos ouvir gritarias, até mesmo choros.
Após o ultimo corredor, não havia nada além de um grande espaço vazio. Um pouco mais pra frente então, havia uma pequena sala.
Esta era diferente. Ao contrário das outras salas que eram uma na frente da outra, esta era a única, e começava do meio. Sua porta também era diferente. Não era velha, mas também não era nova. Era vermelha, no mesmo tom das marcas nas paredes.
Scott e eu fomos em direção a porta, cada um de um lado. Esperamos um pouco, tentando ouvir algum som.
Depois de uns cinco minutos, Scott fez sinal para entrarmos e concordei. Ele ia chutar a porta, quando eu o impedi.
Apontei para a maçaneta e mostrei que não havia lugar para porta alguma chave. Só precisava empurrar. Demonstrei, e então entramos. 
Scott entrou apontando a arma, e eu fiquei mais atrás.
O lugar era pequeno e escuro. A única iluminação era a luz que vinha da porta aberta.
Em meio à escuridão, pude notar uma cama de casal bagunçada, e em cima dela, uma menina enrolada num lençol.
Ela chorava muito, e ficou extremamente assustada com a nossa entrada. 
Em meio a soluços, implorou.
Menina: Por favor... De novo não... Por favor...