segunda-feira, 21 de julho de 2014

Suspect - Capítulo 5: Scott

5. Observe
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Contei tudo. Como eu havia feito meu primeiro contato com Cristopher, até eu começar a ser treinada.
Quando terminei, ele pareceu ficar sem palavras.
Não conversávamos muito sobre nosso passado. O que Alexander sabia até então, era que eu havia crescido num orfanato, e me transformado numa assassina por causa de Cristopher. Descobrir tudo de uma hora para a outra com certeza foi um choque.
O desenho do homem que havia sequestrado Estela e a foto dela estavam sobre a mesa de Alexander.
Alexander: Então quer dizer que o homem que supostamente sequestrou a garota... É o mesmo que ameaçou você e Cristopher?
Afirmei.
Alexander: E então seu amigo o matou? Simples assim? E como os parceiros dele não foram atrás de vocês?
Charlotte: Eles não vieram atrás de mim, mas quem disse que não foram a procura de Cristopher?
Alexander: Se for assim, existe uma grande probabilidade dele estar morto, não concorda?
Encarei o chão. Na verdade, sim, eu concordava. Já havia pensado sobre isso diversas vezes, mas não era uma teoria que eu realmente gostava. 
Quer dizer, ele não podia morrer. Pelo menos não até me responder algumas perguntas. Ele mudou o rumo da minha vida, e saiu dela sem dar explicações. Claro, não era como se ele tivesse sido extremamente participativo, mas, aqueles poucos minutos em que estivemos juntos, decidiram qual seria o meu destino. Talvez, eu até devesse alguns agradecimentos a Cristopher, quem sabe.
Meus pensamentos foram interrompidos quando ouvi uma batida na porta. Alexander se levantou para atender. Notei que ainda mancava um pouco.
Ao abrir a porta, escutei uma voz feminina perguntando por mim. Levou alguns segundos para eu conseguir reconhecer. 
Alexander fez o possível para despista-la o mais rápido possível, dizendo que eu não estava e iria demorar. Quando ela saiu, comecei a rir.
Ele jogou um vidro de esmalte preto para mim. 
Alexander: Você podia parar de usar as funcionárias daqui como suas empregadas?
Ele se referia a uma das atendentes da delegacia, mais precisamente a qual acabara de sair.
Charlotte: Claro. Então um dia sairei para comprar um simples esmalte, e alguém gritará: olhe, aquela garota é uma assassina!
Ele suspirou.
Alexander: Não exagere.
Em seguida, olhou para seu relógio e murmurou algumas palavras obscenas.
Charlotte: Atrasado para o jantar?
Meus pés estavam em cima de sua mesa, e eu observava atentamente o meu novo esmalte preto.
Alexander pegou seu casaco que estava em cima de sua cadeira, e então começou a procurar as chaves de seu carro.
Alexander: Ela odeia quando eu me atraso.
"Ela" era sua namorada. Alexander e a garota namoravam desde que eu o conhecia, e até então eles nunca haviam se separado. Não que eu soubesse.
Charlotte: Me pergunto se eu vou ser convidada para o casamento.
Alexander: Que casamento?
Encarei-o, séria.
Charlotte: Você ainda não pediu a mão dela? Há quanto tempo que estão juntos? Já não está na hora?
Alexander: Eu não tive tempo de pensar nisso, certo? Agora, boa noite, Charlotte.
Sorri de maneira inocente, e então desejei boa noite. 
Me levantei, e então fui em direção ao meu quarto. Eram quase oito horas da noite, e eu iria atrás do garoto.
Observei o mapa do cartão, e percebi que, pelos pontos de referência, era um bairro fino. No caso, meu moletom e tênis pretos iriam chamar muita atenção no meio das pessoas da alta sociedade.
Substitui meus tênis por um par de botas curtas com salto, na cor preta, e abandonei o moletom e vesti um sobretudo na mesma cor da bota. Coloquei mais alguns acessórios, e então me senti pronta para seguir com o plano. 
Peguei o cartão e o coloquei em um dos bolsos. Resolvi levar a foto de Estela também. Caso minha missão fosse um fracasso, iria até o beco para coletar informações.
Depois de uma ultima olhada no espelho, resolvi ir logo. 
Cumprimentei os funcionários e saí. 
Andei por cerca de trinta minutos, até achar a rua exata. Andei lentamente, observando todas as lojas e restaurantes que ali haviam. Estava tudo na ordem do cartão.
Quando cheguei ao final da rua, notei que ela não tinha saída. Ali, entre duas lojas de roupas caras, estava um restaurante fino. Ergui a cabeça para ler o letreiro com o nome do lugar, e notei que não havia nenhum "x". Já esperava por isso.
Olhei em volta, mas não havia nenhum sinal do garoto. Comecei a me perguntar se eu havia interpretado o cartão de maneira errada. Fiquei ali, parada, pensando. Até ali tudo havia dado certo. Não sabia se devia dar meia volta, ou procurar algo no local.
Um garçom se aproximou.
Garçom: Charlotte?
Confesso que me assustei. Não é sempre que vemos garçons atendendo na calçada, fora do seu local de trabalho. Sem mencionar o fato de que ele sabia meu nome.
Encarei-o.
Garçom: Você é a Charlotte, certo? Venha, ele está te esperando.
Mesmo confusa, eu o segui. Afinal, não tinha nada a perder.
Logo, avistei-o em uma mesa perto das janelas, num lugar onde as plantas artificiais bloqueavam quase toda a visão. Sorriu ao me ver.
Sentei-me na cadeira a sua frente e então ele dispensou o garçom.
Ficamos um tempo em silêncio. Notei que ele me observava atentamente. Algo passava pela sua cabeça, e eu queria saber o que era, mas sabia que ele não me contaria tão fácil. Algo me preocupava, mas não sabia exatamente o que era.
Garoto: Por que está tão tensa?
Sua voz era calma, e ele me encarava com um olhar de diversão. 
Pensei bem antes de respondê-lo.
Charlotte: Quem é você?
Garoto: Meu nome é Scott. Trabalhamos na mesma área.
Scott. O "S" no cartão era de Scott. As peças estavam começando a se encaixar.
Scott: Estamos atrás da mesma pessoa.
Charlotte: Como sabe que estou atrás dele?
Ele riu.
Scott: Eu sei de muitas coisas.
Charlotte: Se você sabe tanto, por que precisa de mim?
Ele permaneceu calado por um momento.
Scott: Você está tão desconfiada assim? 
Fiquei em silêncio.
Scott: Charlotte, eu preciso de sua ajuda para encontra-lo. Eu tenho as informações que você procura há tantos anos. Na verdade, eu tenho até mais. Mas, cheguei num ponto que preciso de mais alguém para me ajudar, e você é a pessoa ideal.
Eu estava curiosa. Ele parecia ser inteligente e esperto, mas algo me fazia desconfiar dele. Talvez, fosse o medo. Ninguém nunca havia me procurado para fazer alguma proposta de parceria, e Scott parecia saber demais para alguém que queria apenas uma ajuda.
Charlotte: Não.
Me levantei.
Scott: Charlotte... espere.
Ao tirar o cartão do bolso, deixei a foto de Estela cair sobre a mesa. Antes que eu pudesse pega-la, Scott arrastou a foto pela mesa de vidro, de modo que ele pudesse ver.
Scott: Quem é essa? Sua amiga de infância? Achei que você era inteligente o suficiente para saber que não devemos carregar objetos pessoais quando estamos trabalhando.
Charlotte: Eu não a conheço, mas preciso encontra-la. 
E então, eu tive uma ideia.
Charlotte: Você a conhece?
Ele jogou a foto na mesa e se levantou.
Scott: Talvez.
Scott começou a andar até a saída. Peguei a foto e o cartão que estavam sobre a mesa e os coloquei no bolso.
Saímos do restaurante, ele parecia estar se divertindo.
Charlotte: Espere! Quem é ela?
Ele parou na frente de uma loja.
Scott: Você não confia em mim o suficiente para aceitar uma simples proposta, mas confiará no que eu falar sobre essa menina? Isso não parece certo.
Ele voltou a andar, agora mais devagar, de maneira que eu pudesse acompanha-lo, mesmo que eu ficasse alguns passos atrás.
Charlotte: Façamos o seguinte.
Ele parou, ainda virado para a frente.
Charlotte: Me ajude a encontra-la, e então... pensarei sobre sua proposta.
Por um momento, o vi sorrir.
Ele se aproximou, mas sua expressão era séria.
Scott: Não quero que você pense, quero uma certeza.
Eu sabia que poderia encontrar menina sozinha, não precisava dele. Mas algo me fez aceitar.
Scott: Ótimo. Venha, vamos dar uma volta.
Andei ao seu lado. Ficamos em silêncio até chegarmos num parque famoso da cidade.
Havia um ou dois casais de adolescentes por ali, e alguns garotos andando de skate.  Nos sentamos em um banco de madeira, perto de algumas arvores.
Scott: Caso não saiba, essa menina cresceu. Eu não sei o nome real dela, mas seu pseudônimo é Fire.
Charlotte: Vocês trabalhavam juntos?
Ele sorriu maliciosamente.
Scott: É... Por ai.
Suspirei.
Scott: Ela é uma traficante. Assumiu os negócios de sua mãe.
Charlotte: Eu soube que ela foi sequestrada por um homem que ninguém conhece.
Scott: O que? Não. Sua mãe fugiu com ela alguns dias depois de tê-la. 
Charlotte: Isso é impossível. O pai dela disse que a mãe morreu.
Scott: Ela pagou a um médico para dizer isso. 
Charlotte: Mas ela foi sequestrada quando tinha dez anos, pelo chefe do pai dela...
Ficamos em silêncio. "Fire" ou Thomas haviam mentido, mas como descobrir qual das duas histórias eram verdade?
Charlotte: E se não estivermos falando da mesma pessoa?
Scott: Como isso seria possível? Eu tenho certeza que é ela. Eu poderia reconhecer esse cabelo ruivo em qualquer lugar.
Charlotte: E se ela tiver uma gêmea?
Ele ficou pensativo.
Scott: Só temos uma maneira de descobrir.
Charlotte: Qual?
Ele se levantou.
Scott: Procurar o médico que a mãe de Fire supostamente subornou.
Ele começou a andar depressa em direção a saída do parque. Levantei-me logo e me esforcei para acompanhar seus passos.
Charlotte: Você sabe quem é?
Ele me encarou, e em seguida sorriu.
Scott: Talvez.