9. Nem tudo nessa vida é fácil
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Scott: Minha
vítima.
Ele
manteve o mesmo tom sério. Com certeza uma pessoa diferente da noite anterior.
Confesso
que eu não soube como reagir. Quer dizer, de todos os assassinos no mundo, por
que logo ele?
Charlotte: Desculpe,
mas não sei do que você está falando. Adam veio me procurar para matar seu
amigo que está ameaçando a segurança dele e de sua família.
Scott: Oliver
teve sua neta sequestrada por Adam.
Pensei
por um momento.
Charlotte:
Quem é Oliver?
Scott: Meu
cliente.
Empurrei
a foto que havia ganhado de Adam para Scott, e então apontei para o outro
homem.
Charlotte: É
esse aqui?
Ele ficou
pensativo por alguns longos segundos, e então confirmou.
Charlotte: Como
você tem certeza de que Adam sequestrou a neta de Oliver?
Scott: É simples. Os dois
estão brigando há anos, e agora, a neta de um deles desaparece. Quem você
culparia?
Charlotte: Isso
não significa nada. Eu quero provas.
Scott: Eu
já investiguei essa história inteira. Mas vá em frente. Faça do seu jeito.
Peguei
a foto e a coloquei no bolso. Em seguida, levantei.
Charlotte: É o que farei.
Fui
em direção ao beco. Mesmo que ainda fosse cedo para o local estar cheio, eu
sabia que a pessoa que eu precisava estaria lá.
No
caminho, pensei sobre o assunto. Obviamente, um dos dois estava mentindo. As
histórias eram extremamente semelhantes. O problema não seria apenas descobrir
quem, mas sim se valeria a pena mata-lo. E, se não valesse, como dizer para o
outro? Se realmente houve um sequestro, não duvidaria nem um pouco que Adam e
Oliver poderiam acabar matando um ao outro.
Quando
cheguei no beco, ele estava lá.
"Todd"
fora como disse que se chamava quando eu o conheci, mas eu sabia que estava
longe de ser o seu nome verdadeiro. Ele tinha pelo menos trinta anos, era um
traficante bem informado.
Mesmo
que afirmasse nunca ter usado drogas, eu desconfiava de que, pelo menos no seu
passado, já havia se envolvido. Porém, nunca perguntei sobre isso.
Ele
estava sentado numa cadeira do canto, junto de outros frequentadores mais
jovens do beco. Jogavam cartas.
Charlotte: Preciso
falar com você.
Não
precisei me referir a alguém para Todd saber que era com ele. Imediatamente, se
levantou e jogou uma combinação de cartas que deveria ser muito boa porque,
assim que o fez, os outros jogadores reclamaram e começaram a recolher suas
cartas para embaralhar novamente.
Nos
sentamos perto da porta. Ele segurava um cigarro que ainda não havia sido
aceso. Notei que estava se esforçando para não acende-lo, já que sabia que o
cheiro e toda aquela fumaça não me agradavam.
Todd: Do
que você precisa?
Mostrei
a foto a ele e contei toda a história.
Todd: Eu
realmente não ouvi falar de algum sequestro cometido por um velho, mas vou
ficar atento.
Sorri,
agradecida.
Ficamos
ali por alguns minutos, em silêncio. Agora eu precisava pensar em um novo lugar
para começar minha busca. Ainda não podia ir diretamente até Oliver.
Todd: Eu
acho que conheço alguém que pode te ajudar.
Ele
chamou um dos garotos pelo nome e pediu papel e algo que escrevesse. O menino
cumpriu a ordem no mesmo instante.
Todd
apoiou o papel na parede e desenhou algumas linhas. Apontou para um ponto no
canto da folha.
Todd: Estamos
aqui certo?
Concordei.
Ele explicou o mapa pacientemente, chamando algumas ruas e esquinas pelo nome
que usava durante seu trabalho. Fez um circulo em volta de um quadrado,
indicando a casa que eu deveria achar.
Em
seguida, contou sobre a pessoa que eu deveria procurar.
Todd: Seu
nome é Santiago. Ele é meu informante. Quando recebo novos clientes, peço para
ele verificar. Sabe como é, né?
Peguei
o papel e coloquei no bolso de trás do meu jeans.
Charlotte: Obrigada,
Todd.
Sai
do beco e analisei o mapa. Pensei em ir até a delegacia para pegar uma arma, só
para garantir, mas Alexander não gostava que eu entrasse e saísse muito, mesmo
que meu quarto fosse separado de sua sala.
Resolvi
ir direto até Santiago. Não era muito longe dali.
Notei
que a casa do informante ficava num bairro em que a maior parte dos moradores
eram espanhóis e mexicanos. Este bairro também era considerado
"miserável" e "perigoso" pelos adultos que viviam uma vida
relativamente boa, de forma que a maioria de suas crianças eram instruídas a
ficar longe. Do meu ponto de vista, isso era besteira. Eu já havia estudado com
uma moradora do mesmo bairro, e ela, por mais que fosse pobre, não era
"perigosa".
Caminhei
pela rua. Até então, parecia um bairro calmo. Olhei o pequeno mapa e logo
localizei o local.
Santiago
vivia numa casa com uma boa aparência externa. Era de madeira, pintada de um
leve tom de creme, com detalhes brancos nas janelas, que possuíam cortinas da
mesma cor. Tinha uma pequena varanda de três degraus de altura que levava a
porta de entrada.
Havia
dois homens sentados na varanda, ambos com cigarros na mão. Foi quando um deles
se curvou para pegar uma lata de cerveja no chão que notei que ambos estavam
armados. Me arrependi de não ter ido até a delegacia, mas avancei em direção a
casa mesmo assim.
Quando
me aproximei, os dois homens imediatamente lançaram seus olhares em minha
direção.
Charlotte: Eu
preciso ver Santiago.
Eles
se entreolharam.
Primeiro
homem: Não há nenhum Santiago aqui.
Apenas
repeti a pergunta.
Eles
começaram a sussurrar e então um deles gritou algo espanhol. Um homem de
aparência semelhante aos dois primeiros afastou levemente a cortina com uma das
mãos para observar o lado de fora, e então rapidamente se afastou. Segundos
depois, pude ouvir o som da porta da frente abrir.
Os
três começaram a conversar em espanhol, onde as únicas palavras que pude
entender foram "ella" e "Santiago”.
Em
seguida, o terceiro homem fez sinal para que eu entrasse.
Os
moveis velhos e manchados me lembravam um dos orfanatos em que vivi.
Passamos
por um corredor empoeirado, mas barulhento, e fomos em direção a ultima porta
do corredor, que estava entreaberta.
O
homem deu duas batidas na porta e logo a abriu num gesto para que eu entrasse.
Não
soube dizer que tipo de cômodo aquele deveria ser. Havia cadeiras de plástico e
mesas de madeira já estragada no local. Um homem com uma magreza quase que
doentia estava sentado numa cadeira próxima à porta. Tinha cabelos loiros, mas
desidratados, longos o suficiente para fazer um pequeno rabo de cavalo baixo.
Um
segundo homem estava sentado mais ao fundo da sala, com os pés apoiados na
mesa. Este tinha uma pele levemente bronzeada. Também era magro, mas usava uma
regata branca que destacava seus músculos.
O
homem loiro se levantou e, junto do meu "guia", se retirou da sala.
Obviamente, aquele era Santiago.
Ele
permaneceu com seu olhar fixo em mim. Depois de um tempo em silêncio, começou a
fazer perguntas em espanhol.
Charlotte: Todd
me mandou aqui. Eu sei que você fala a minha língua.
Santiago
encarou o chão. Havia um sorriso malicioso em seus lábios.
Santiago: O
que você quer?
De
inicio, desconfiei por nem perguntar meu nome, mas então lembrei que Todd
deveria ter uma grande influência sobre ele.
Pensei
em enrolar um pouco, avalia-lo para ter certeza que era confiável, mas eu não
tinha tempo.
Aproximei-me
e tirei a foto do bolso jogando-a sob a mesa em que ele apoiava os pés.
Santiago se ajeitou na cadeira, inclinando-se para observar a imagem. Notei que
havia alguns anéis de ouro em ambas as mãos.
Charlotte: Preciso
saber a história desses homens.
Ele
permaneceu em silêncio, analisando a foto.
Santiago: Duas semanas.
Charlotte: 24
horas.
Ele
soltou uma gargalhada sem humor enquanto se encostava na cadeira novamente.
Santiago: Escute
querida, não tenho tempo para procurar a história de um trio de velhos apenas
porque você quer. Eu tenho gente mais importante e útil para ajudar do que
você.
Eu
comecei a planejar uma ameaça, algo que não fosse partir para uma agressão
física, até que prestei mais atenção em suas palavras.
Charlotte: Um
trio? Mas há apenas duas pessoas nessa foto.
Ele
apontou para um traço quase invisível de um dedo mínimo, exatamente onde a
imagem fora rasgada. Junto de sua outra metade, formaria um terceiro
homem.
Santiago: Você
não notou isso?
Neguei.
Santiago suspirou.
Santiago: Vou
fazer esse favor para você. Volte aqui amanhã, nessa mesma hora.
Não
pude deixar de sorrir.
Santiago: Não
se sinta exclusiva, porque você não é... Seu nome?
Respondi
educadamente, e logo caminhei até a porta.
Charlotte: Obrigada.
Santiago: Ei,
querida, vai ficar me devendo um favor. É melhor não se esquecer disso.
Após
essa fala, apenas me retirei. O homem que me levara até Santiago e o loiro
esquelético esperavam encostados na parede, um de cada lado da porta.
Apenas
saí, dessa vez, desacompanhada, mas sabendo que os olhares me focavam. A
segurança poderia até ser boa, mas nem um pouco discreta.
Agora,
tudo o que me restava era esperar.
Ainda
era cedo para voltar à delegacia, então resolvi andar um pouco pela cidade.
Não
tinha bem um lugar específico para ir, até porque não tinha dinheiro nem para
comprar uma bala.
Andei
até o meu último orfanato. Era um prédio velho, e se não fosse pelos gritos das
crianças, qualquer um diria que era um lugar abandonado.
Devo
admitir que tive bons momentos ali, mas todas as crianças com quem me dava bem
eram rapidamente adotadas, e os únicos adolescentes ali eram dois irmãos um ano
mais velhos que eu, de forma que logo eles foram embora e acabei me tornando
a órfã mais velha dali.
Continuei
andando, passando por locais que frequentava depois da escola. Por algum
motivo, Todd me veio na cabeça.
Desde
que eu o havia conhecido, ele havia sido gentil, me defendendo quando ainda não
havia conquistado o respeito e entendido as regras do beco.
Algo
em que todos no "esconderijo" concordavam, era de que Todd possuía
uma grande quantia em dinheiro, mas ninguém jamais descobrira onde ele morava.
Mesmo
que eu não falasse o que acontecia comigo, ele sempre tentava me ajudar da
melhor maneira possível. Era um garoto extremamente inteligente e, diversas
vezes, me convidou para morar com ele. Neguei todas as vezes.
Nunca
entendi se havia alguma segunda intenção nisso, ou se era apenas um ato de
amizade, mas preferia não arriscar.
Não
sei por quantas horas eu andei, mas sei que já estava anoitecendo quando
resolvi voltar para a delegacia.
A
rua estava silenciosa, sem carros. Eu permanecia pensativa, relaxada, um jeito
que eu não ficava havia muito tempo. Mas tudo mudou quando, enquanto passava
por um beco, ouvi o som de uma lâmina e um grito, seguido de vários outros.
Logo me lembrei do que ouvira na noite anterior.