sábado, 10 de maio de 2014

Suspect - Capítulo 1: Flashback

1. Ignore seus sentimentos.
________________________________

Flashback on

Era hora do almoço, por volta de meio-dia. Uma sexta-feira, o nosso último dia onde teríamos aulas no período matutino e vespertino.
Estava no refeitório, sentada em uma das mesas circulares. Meus sentimentos no momento eram de sono e fome, mas não havia levado dinheiro para pagar o almoço.
Logo após encontrar uma posição agradável para dormir, uma bandeja pousou ao meu lado. Levantei a cabeça, assustada pelo barulho causado.
Uma de minhas colegas de sala, Amanda, se sentara ao meu lado. Eramos próximas. 
Fiquei surpresa com a quantidade de comida em seu prato, que parecia ser mais do que ela poderia comer, a julgar pelo seu magro corpo.
Carol, outra de nossas amigas, ocupou um espaço na mesa logo em seguida, também com uma bandeja.
Observei o prato das duas. Amanda era extremamente magra, e aparentemente, a quantidade de comida em seu prato daria para alimentar mais umas duas ou três garotas como ela. Enquanto isso, Carol tinha uma quantidade de quilos considerável, acima do seu ideal. Mesmo assim, seu prato havia tão pouca comida que, provavelmente, nem para uma pessoa como Amanda aparentava ser, aquilo seria suficiente.
Mais tarde, Carol revelou que estava de dieta. 
Olhando para o lado, avistei Cristopher num canto, falando no celular. Ele era um garoto que não se enturmava muito, mas todos sabiam que era extremamente inteligente e habilidoso nos esportes. Suas notas eram uma das melhores do nosso ano.
Lembrando que ele seria minha dupla num dos trabalhos para a próxima semana, resolvi perguntar se alguém sabia algo sobre ele. Tudo o que eu sabia sobre ele era seu nome.
Charlotte: O que vocês sabem sobre o Cristopher?
Enquanto Carol pensava, Amanda tentava engolir o mais rápido possível um pedaço de carne, para poder falar.
Amanda: Eu o vi uma vez depois da escola, acho que ele estava voltando para casa, seguíamos o mesmo caminho. Eu ia tentar iniciar uma conversa, mas quando me virei para chama-lo, havia sumido.
Aquilo não me era útil. Queria saber como era sua personalidade, para saber como lidar com ele.
Amanda: Ah, por que não pergunta ao meu irmão? Ainda há um lugar na mesa em que ele está, vá logo.
Olhei em volta, procurando a mesa que ela havia mencionado. 
Quase todas as mesas do refeitório eram em formato circular, tendo espaço para seis pessoas. Havia algumas retangulares, onde algumas permitiam quatro e outras duas pessoas.
Avistei a mesa, que realmente havia um espaço sobrando. Sem dizer uma palavra, me levantei e fui até lá.
Ao me sentar, todos os olhares vieram para mim.
Charlotte: Cristopher. Me falem sobre ele.
Eles se entre olharam. Era como esperar um computador pesquisar um arquivo. Felipe, irmão de Amanda, foi o primeiro a dizer algo.
Felipe: Não foi ele que bateu naquele novato do ano passado?
Charlotte: O que? Por que?
Fui ignorada.
Um dos garotos: Ah sim. Depois daquilo, ele se afastou e começou adiantar as matérias. Saiu da escola no meio do ano.
Charlotte: Mas o que aconteceu? Não me ignorem!
Um deles olhou para mim.
Outro garoto: A história foi a seguinte. Você sabe que Cristopher é quase que totalmente isolado do resto da turma, certo?
Afirmei.
Outro garoto: Um novato, no ano passado, perdeu para o time do Cristopher no handebol, e quis provocar ele.
Charlotte: E ai?
Outro garoto: Ele começou a zoar Cristopher, dizendo que ele se achava, e havia ganho apenas por sorte.
Felipe: A verdade é que ele sabe escolher um bom time.
Um dos garotos: Exato. Por isso que ele escolheu você para a reserva.
Tive que segurar o riso. Felipe xingou o garoto. O outro garoto, que estava contando a história, continuou.
Outro garoto: O novato sugeriu que jogassem mais uma partida. Mas não outro dia, ele queria naquela hora. E você já deve ter notado que Cristopher é correto. Ele não costuma faltar as aulas. Para jogar mais uma partida, perderíamos em torno de duas aulas. Obviamente, ele negou. O novato começou com as brincadeiras, dizendo que ele estava com medo, você sabe, esse tipo de brincadeira. Cristopher ignorou, mas o novato não parava. Quando Cristopher resolveu sair do vestiário, o novato puxou o braço dele.
Dois dos garotos que estavam sentados na mesa se levantaram e começaram a encenar o ocorrido.
Outro garoto: Ah, mas não deu outra. O novato mal teve tempo de terminar a frase. Cristopher se virou e deu um tapa na cara do garoto, que caiu no chão. O novato se levantou e partiu para cima novamente...
Felipe interrompeu o garoto pela segunda vez.
Felipe: O cara não teve chances.
Suspirando, o garoto continuou.
Outro garoto: Cristopher percebeu que o novato não ia deixar ele em paz. O garoto tentou dar-lhe um soco, mas ele se defendeu com tanta facilidade que até estranhei. Em seguida, começou a bater no garoto. Não precisou muito para fazer o novato sangrar. Creio que se não tivéssemos o impedido, o garoto teria ferimentos graves. Foi naquele momento que percebi que ele era muito, muito mais do que aparenta ser. 
Felipe: Sempre quis saber o porquê dele ser assim. Ninguém sabe nada sobre ele. É... estranho...
O sinal que marcava o fim do almoço bateu.
Felipe: Te vejo mais tarde.
Ele tentou me puxar para perto, mas o empurrei com mais força do que ele esperava. Tinha motivos para acreditar que eu era uma das únicas garotas a recusar a aproximação de Felipe.
Charlotte: Não, não verá.
Fingindo uma expressão triste, ele correu para alcançar os outros garotos que se dirigiam a sala.
Amanda e Carol se aproximaram.
Amanda: E então?
Charlotte: Seu irmão... ele é um idiota.
Carol riu.
Carol: O ódio leva ao amor...
Charlotte: Não fale besteiras.
Começamos a caminhar até a sala.
Amanda: Eles foram úteis?
Charlotte: Creio que sim... Hoje as aulas acabarão mais cedo, certo? Tentarei falar com ele...
Amanda: Boa sorte.

Algumas horas depois

Apressei-me em guardar meu material. Olhando em direção a porta, vi Cristopher já descendo as escadas. 
Sem me despedir de Amanda e Carol, corri para alcança-lo. Ele estava passando o portão da escola, quando finalmente consegui me aproximar.
Charlotte: Então... Oi?
Aparentemente, eu havia sido ignorada.
Charlotte: Você... É o Cristopher, não é?
Sua resposta foi afirmativa, com um movimento quase que imperceptível com a cabeça.
Charlotte: Você sabe que temos um trabalho para fazer juntos, certo?
Percebi que, a essa altura, ele já havia apressado o passo. Eu o acompanhava, com um pouco de dificuldade. 
Ele me respondeu com o mesmo sinal. Eu já estava ficando sem graça, e pensava em continuar meu caminho afastada dele, já que minha casa era na mesma direção que ele estava seguindo.
Charlotte: Então... Quando você...
Jogando sua mochila para um dos lados da calçada, me assustei quando ele falou algo.
Cristopher: Se abaixe.
Charlotte: Como?
Antes que eu tivesse tempo se quer para piscar, ele me empurrou, fazendo com que eu caísse no chão. Escutei o som de dois tiros seguidos.
Ainda no chão, me virei para encara-lo. Uma arma estava apontada, não para mim, mas para um garoto que agora estava estirado no chão, não muito longe de nós.
Ainda com a arma apontada para ele, Cristopher andou até o garoto. 
Me levantei, com um pouco de medo, e o segui.
Cristopher checou a pulsação do garoto, e pude ouvi-lo dizer para si mesmo enquanto me aproximava.
Cristopher: Morto.
Ele parecia pensativo agora.
Me aproximando, arregalei os olhos ao reconhecer o garoto.
Charlotte: Você... Você matou o irmão da Amanda!
Se levantando, ele me encarou, agora sério.
Cristopher: Preferiria que ele nos matasse?
Então notei que Felipe segurava uma arma.
Comecei a pensar em voz alta.
Charlotte: Ele não ia atirar em você... Não... Não em mim... Não em nós... Ele... Ele...
Sentir lágrimas começarem a encher meus olhos. 
Olhando ao redor, Cristopher suspirou.
Cristopher: Vamos, não temos tempo.
Sem que eu pudesse me manifestar, ele segurou meu pulso e começou a correr. Eu mal podia acompanha-lo.
Charlotte: Do que está fugindo?
Entramos num pequeno mercado e nos escondemos entre as prateleiras. Ele pediu silêncio.
Escutamos passos, eram lentos. Confesso que fiquei assustada.
Cristopher tentava controlar sua respiração, que estava um tanto rápida demais devido a corrida. 
Um idoso, asiático, apareceu. Tentava esconder um pedaço de madeira que segurava. Pareceu ficar aliviado ao ver que não era nenhum assaltante. Em seguida, ouvimos passos rápidos passando pela frente do mercado. Esperando alguns segundos, Cristopher foi até a porta.
Cristopher: Passaram reto.
Charlotte: Quem?
Eu estava ficando impaciente.
Ao olhar para mim, Cristopher arregalou os olhos. 
Senti algo encostar na minha cabeça, e então escutei o som de uma arma sendo engatilhada. Meu coração começou a bater rápido.