sábado, 3 de janeiro de 2015

Suspect - Capítulo 10: Uma grande teoria

10. Esteja sempre em boa forma, nunca se sabe quando precisará correr.
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Uma pessoa em sã consciência se afastaria e fingiria que não ouviu nada, ou chamaria a polícia e sairia dali o mais rápido possível. Alguns corajosos, armados, entrariam ali. No meu caso, entrei sem arma ou reforço. Não sei se isso seria uma "coragem suprema" ou uma extrema burrice. Provavelmente a segunda opção.
Avancei até avistar a silhueta de um homem. De início, ele não notou a minha presença. Preferi observar suas ações, já que estava em desvantagem. Pude ouvi-lo fechar uma porta, provavelmente o local onde a criança estava. Ainda era possível ouvi-la chorar. Ele se virou, e então pude ver seu rosto. Havia uma expressão de tranquilidade. Em suas mãos, uma faca manchada com sangue.
Quando ele me viu, sua expressão mudou para fúria. 
Homem: O que está fazendo aqui? Esse lugar não é ideal para garotas.
Cruzei os braços e passei a encarar a faca.
Homem: Você não viu nada, certo?
Movi a cabeça em sinal positivo.
Homem: Ora, sua...
Ele não completou a frase, pois se ocupou em me atacar. Desviei de um golpe com a faca que mirava o meu pescoço, mas, em compensação, ele agarrou meu braço. O homem era mais forte do que aparentava. Ele continuava tentando me acertar com a faca, mas enquanto eu desviava, atraia-o para a rua. Num momento de distração acertei seu nariz com meu punho. Atordoado, lancei-o para a rua no exato momento em que uma moto passava a toda velocidade. 
O impacto fez com que o motoqueiro caísse, mas acredito que os danos maiores foram causados ao homem atropelado.
Encarei-o ali no meio da rua, e então tive uma ideia. Corri até o motoqueiro e ajudei-o a se levantar. Não estava gravemente ferido, mas sentia dores fortes no braço e na perna por causa da queda. Me ofereci para acompanha-lo até um hospital, mas, como pretendido, ele recusou. Depois de se arrumar, foi embora lançando-me um sorriso que preferi ignorar. Algumas pessoas paravam para observar o que estava acontecendo. Percebi que o homem estava pouco consciente, de forma que pude pegar sua faca sem reclamações. Em seguida, consegui faze-lo levantar e apoiar um de seus braços no meu ombro. Eu o levei para a delegacia. Pela hora, provavelmente Alexander já teria ido embora. Não foi tão fácil.
Algumas vezes, enquanto caminhávamos, notei que ele estava voltando a ter consciência do que estava acontecendo, fazendo com que eu aplicasse alguns golpes que o atordoava por um tempo. Eram quase sete horas da noite e os policiais estavam na troca de turnos. Assim, passei despercebida. Ao chegar à porta que levaria para o corredor entre meu quarto e a sala de Alexander, notei que havia um garoto bloqueando a passagem. Ele deveria ter seus vinte e três anos, e usava o uniforme da policia. Estranhei, pois nunca havia o visto.
De alguma forma, ele me reconheceu. 
Policial: Você deve ser a Charlotte, certo? 
Não respondi, perplexa. O homem pesava em meus ombros. 
Policial: Alexander me falou de você!  Ele pediu para supervisiona-la. Você sabe, entrei na academia recentemente e ele gostou de mim... Deve estar me testando para algo maior...
A felicidade com que ele dizia aquilo era sobrenatural.
Revirei os olhos e avancei em direção a porta, mas ele a bloqueou.
Policial: Ele me disse as regras. Sem homens. 
Charlotte: Não vou obedecer a suas ordens. Estou trabalhando, você pode me dar licença? 
Em seguida, chutei sua canela e ele se agachou, com dor. Abri a porta, que estava apenas encostada, e joguei o homem no chão do corredor. 
Voltei-me ao policial, que agora estava sentado ao pé da porta.
Charlotte: Você tem algemas? 
Policial: O quê?
Charlotte: Algemas.
Policial:  Não vou te dar algemas!
Charlotte: Não estou pedindo.
Dessa vez chutei seu estomago e ele gemeu. Em seguida, esticou-as junto das chaves.
Este não era um comportamento comum vindo da minha parte. Mas, normalmente, os policiais que me conheciam costumavam a me ajudar. O novato, no entanto, era um tanto fiel demais a Alexander, de maneira que me atrapalhava.
Charlotte: As chaves da sala dele.
Policial: Não posso... Fazer isso...
Deixei a faca amostra. Não era como se eu fosse realmente fazer algo, mas ele exalava medo e não hesitou em me dar o chaveiro. Agradeci, sorrindo como se nada tivesse acontecido.
No chaveiro havia três chaves: da porta principal, da porta da sala e das gavetas da mesa de Alexander.  Abri a porta e o arrastei. Obviamente, ele era pesado. No meio do caminho, ele acordou e começou a dificultar o meu trabalho. Encarei a faca que eu segurava. Era muito difícil arrastar alguém com um objeto daqueles em mãos. 
Ele sentou no chão. Era claro que estava com dores na cabeça - e em todo o resto do corpo.  
Charlotte: Acho melhor você levantar. 
Homem: Se não o que?
Seu tom era zombador. Joguei a faca com força em sua perna. Eu não tinha uma mira, até porque eu não era lá essas coisas em tiro ao alvo, mas, por sorte, acertei sua coxa.
Ele urrou de dor.
Charlotte: Agora você vai fazer o que eu mandar, não é?
Ele permaneceu calado. Lentamente, retirei a faca de sua perna, da forma mais dolorida possível. Chutei sua perna e ele novamente gritou. 
Charlotte: Eu fiz uma pergunta. 
O homem me encarou, um olhar vingativo tomava conta de seus olhos. 
Charlotte: Sente-se naquela cadeira.
Indiquei a cadeira de Alexander.
Gemendo, ele mancou até a cadeira. Sorri, satisfeita. Caminhei até ele e coloquei as algemas, uma delas em uma de suas mãos, e outra na mesa do delegado, que era soldada ao chão.  Notei que Alexander havia deixado um casaco no cabideiro que ficava no canto da sala. Sabendo que ele sempre tinha um par de algemas escondido em algum lugar, vasculhei a peça. Em um dos bolsos internos, lá estava. Usei para prender a outra mão a mesa. Ele se esforçava para se soltar, mas era totalmente inútil. O homem gritava, e isso começou a me preocupar. Não queria chamar atenção. 
Fui até uma das gavetas de Alexander e a abri. Ele tomava calmantes. Eu sabia disso porque várias vezes ele dissera que eu era a culpada por isso. 
Peguei um dos frascos e agradeci por ser líquido, facilitaria meu trabalho. Abri o vidro e dei meu melhor para fazê-lo engolir o conteúdo. Ele tossia e ainda gritava, mas sabia que logo ficaria calmo o suficiente para me dar uma tranquila noite de sono.
O remédio demorou quase meia hora para fazer efeito, mas valeu a pena esperar.
Cansada, mas satisfeita, me dirigi ao meu quarto e por lá fiquei até adormecer. 
Acordei no dia seguinte com gritos de Alexander no lado de fora da minha porta. Caminhei, sonolenta, e a abri. Ele estava irritado. 
Alexander: Charlotte.
Charlotte: Em carne e osso. 
Alexander: Que m...
Ele respirou fundo. Alexander estava tentando controlar seu vocabulário, a pedidos de sua namorada. 
Alexander: Quem é esse?
Charlotte: Eu não sei. 
Alexander: O quê? 
Charlotte: Ele estava esfaqueando alguém num beco, achei ele com uma faca ensanguentada. Resolvi fazer uma boa ação e o trouxe pra cá. 
Ele começou a sussurrar meu nome como um tom de ódio.
Alexander: Tire ele daqui. 
Charlotte: Esse é o seu trabalho, não o meu.
Alexander: Você o trouxe. 
Charlotte: Quando uma pessoa entrega um sujeito à polícia, é obrigação dela cuidar do caso?
Ele permaneceu em silêncio. 
Charlotte: Boa sorte.
Voltei para o meu quarto e tranquei a porta. Ele tentou me chamar algumas vezes, mas ignorei.
Eu não tinha muita coisa para fazer a não ser esperar até o momento de ver Santiago.
Tentei evitar Alexander o máximo possível. Sabia que levaria um longo e entediante sermão se o encontrasse.
Perdi o almoço e só sai do quarto quando eu soube que ele não estava mais por perto, e então fui até a casa do informante, dessa vez mais tranquila em relação ao local.
Caminhei lentamente, levando aproximadamente quarenta minutos para chegar ao local.
Não precisei dizer algo, pois os dois homens em frente à casa logo me reconheceram. 
Um deles se levantou e fez sinal para que eu o seguisse. Seu rosto mantinha uma expressão desconfiada.
Fizemos o mesmo trajeto do dia anterior até o ultimo quarto da casa.
Santiago estava lá, no mesmo lugar e posição do dia anterior.
Santiago: Charlie!
Fiquei surpresa, confesso. Havia tempo que não me chamavam por esse apelido.
Charlotte: Não me lembro de termos nos tornado tão íntimos.
O homem que havia me guiado nos deixou a sós.
Santiago: Venha, pode se aproximar.
Receosa, caminhei para perto da mesa. Havia sete fotos além da que eu havia dado a ele em cima da mesa. Três eram de idosos, enquanto outras quatro eram de crianças, todas garotas. Duas delas, gêmeas. A foto rasgada estava no meio das outras, que formavam um circulo em volta dela.
Santiago indicou uma cadeira próxima à mesa, e então fui até ela e me sentei.
Ele apontou para as fotos dos idosos. O primeiro era Adam, e o segundo era Oliver. O terceiro era o homem cortado da foto, seu nome era Wilson.
As gêmeas eram netas de Wilson, enquanto as outras duas eram de Adam e Oliver.
Santiago: Uma das gêmeas morreu por um problema nos rins. Ela deveria fazer um transplante, mas o órgão nunca chegou até ela.
Charlotte: Foi roubado?
Santiago: Exatamente. O tipo de sangue dela era O negativo.
Santiago pegou a foto da gêmea morta e a amassou, colocando-a num dos cantos da mesa.
Santiago: Recentemente, a outra gêmea foi diagnosticada com o mesmo problema da irmã, mas dessa vez ela foi para um lugar muito baixo na lista. Os médicos acham que, pela demora em achar um novo órgão para ela, a garota vai morrer logo. Eu cheguei a mencionar que as outras duas garotas também tem o mesmo tipo de sangue?
As coisas estavam começando a fazer sentido. Wilson havia sequestrado as filhas de seus amigos para salvar sua ultima neta.
Charlotte: Como ele sabia o tipo sanguíneo delas? E por que Adam e Oliver não desconfiaram de Wilson?
Santiago: Ele descobriu, querida, da mesma maneira que descobri. E Adam e Oliver jamais desconfiariam de Wilson porque, há muitos anos, ele simplesmente sumiu. Ambos guardaram rancor dele, já que todos estavam passando por um momento difícil, mas entre os três ele era o que estava em melhores condições. Os velhos acham que ele sumiu para não ajudá-los, mas na verdade ele apenas fugiu com uma mulher. 
Charlotte: Isso não explica o porquê de um desconfiar do outro.
Santiago: Recentemente, Adam e Oliver brigaram. Provavelmente, Wilson estava apenas esperando o momento certo para que não tivesse que se preocupar em cobrir seus rastros. 
Ele empurrou as fotos para o canto da mesa, junto da gêmea amassada. Em seguida, Santiago jogou novas fotos. Dessa vez eram quatro, todas de homens. A primeira ele indicou como o médico que tiraria os órgãos de uma das crianças, contratado por Wilson. O segundo, era o sequestrador das crianças, também contratado por Wilson. O terceiro, era quem mataria uma delas ou ambas, caso o transplante não desse certo. Santiago explicou que, ele contratou o terceiro pois o médico e o sequestrador recusaram a fazer o serviço. Enquanto o quarto, eu infelizmente conhecia.
Santiago: Não preciso dizer que este é Scott, o assassino contratado por Oliver.
Com esta frase, pude perceber que eu havia sido investigada.
Santiago: É isso o que eu tenho. Espero que seja útil a você.
Voltei a observar as fotos. Reconheci o assassino de crianças como o homem que eu havia levado até a delegacia na última noite. 
Peguei todas as fotos que Santiago havia mostrado, exceto pela de Scott.
Charlotte: Posso?
Santiago: À vontade.
Me levantei e caminhei em direção à porta. Antes de sair, ele ainda se manifestou.
Santiago: Ei, querida.
Virei-me para encara-lo.
Santiago: Não se esqueça, você me deve um favor.
Assenti e então sai do cômodo. Dessa vez, não havia ninguém esperando ao lado de fora.
Já conhecendo o caminho, me dirigi para fora da casa. Agora eu deveria ir correndo até a delegacia e torcer para que Alexander não tivesse soltado o homem.
Quando virei na primeira esquina, lá estava ele, encostado numa placa que dizia "PARE".
Charlotte: Por que você está em todo lugar que eu vou?
Scott: Acreditaria se eu dissesse que é pura coincidência?
Charlotte: Não.
Scott: Então vou pensar em outra coisa.
Tentei ignora-lo e não ficar conversando enquanto apressava o passo até a delegacia. E então ele começou a me seguir.
Scott: Aonde você vai com tanta pressa?
Charlotte: Para a delegacia. Adam não sequestrou a neta de Oliver, nem vice versa. Foi Wilson. E eu peguei o homem que fez o trabalho sujo dele.
Agora, nós dois estávamos quase correndo.
Scott: Quem é Wilson?
Resumi a história da melhor maneira possível. Expliquei que Wilson era um amigo antigo deles que havia fugido com uma mulher, e que ele havia sequestrado as filhas dos outros dois por terem um tipo sanguíneo compatível, e assim tentaria salvar sua neta.
Charlotte: Se pegarmos esse cara, ele pode nos levar até as garotas e até Wilson.
Scott: E assim, ninguém morre.

Charlotte: Isso se ele já não tiver colocado o plano em ação.